terça-feira, 29 de março de 2011

Capim não, Carmim!


Todo mundo tem um parente perdido na roça ou conhece alguém que tem. Não contente em pertencer ao primeiro grupo, quis fazê-lo com louvor: tenho uns 83% da população de um distrito com nome de ator da Globo só pra mim. Risadas à parte,  tenho um “causo” interessante pra compartilhar a respeito.

Como toda cidadela perdida na geografia que se preze, não tem shopping, pousada, escola de inglês... enfim, não tem nada. A não ser Carmim. Sim, Carmim, aquela das calças de mais de R$500. Tem pra dar e vender em 60x no crediário da felicidade dos Mamonas.

Num lugar onde a atividade agrícola predomina, em especial o corte de cana, fiquei chocada quando vi a famosa etiqueta reluzir. Mais ainda quando presenciei uma tia-avó comentando com naturalidade, e até certa inocência, que tinha comprado uma calça Carmim. Gente, lá não tem propaganda, marketing de guerrilha ou raio de advertising que o parta. Como vender, então, calças caríssimas no meio do nada?, perguntaríamos pro tio Olivetto. Simples: boca a boca e status.

Imaginem a conversa de duas comadres (serei fiel à realidade na reprodução do sotaque, ok?):

- Óia só a carça nova qui cumprei Cida.

- Ma óia só que coisa Zeza, qui bunita!

- Num é? Paguei os zóio da cara nela, mais de 500 conto!

- 500?! Ma axa cumadre, quê coisa! Ói, vô lá prepará a janta do Neno, dispois nóis cunversa mais.

Que janta que nada, ela foi é correndo pra uma das várias três lojas locais garantir logo sua Carmim! Onde já se viu a comadre aparecer de Carmim na missa de sábado e depois sair desfilando com a dita na praça e ela não?! E assim segue o ciclo: uma conta pra outra, que comenta com outras 17, que saem desesperadas pra mostrar que também podem gastar um mês de trabalho numa calça só... Logo temos a mulherada inteira em polvorosa com suas novas dívidas calças.

Isso mostra que status, luxo e poder são ainda algumas das melhores e mais poderosas armas da propaganda, não importando a forma em que esta se apresente, e que a força do boca a boca é incontestável ainda nos dias de hoje. E como fugir dessa afirmação num vilarejo com média de 3 mil habitantes que sabem tudo da vida uns dos outros?

Como todo fim de mundo que se preze, a viagem de volta é longa e a gente aproveita pra pensar na vida. No meu caso, pensei mesmo no meu modesto armário, com meia dúzia de jeans paraguaios e Carmim nenhuma pra me recepcionar. Pois é, fico eu aqui com minhas várias lojas, poluição e restaurantes. Eles, com ar puro, vida alheia e coleções de crediários de Carmim. E pra vocês, queridas, fica o meu beijo sem marca e com cheiro de manga tirada do pé.


Juliana Matheus é colaboradora do Ideia da Dica. Estudante de publicidade, viciada em internet e dona de textos envolventes e sedutores. Escreve para o IDD sobre campanhas publicitárias e ações de marketing de moda. Contato: julianamatheus9@gmail.com ou @ju_09




















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